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GIZ

  • Foto do escritor: Manuela Torres
    Manuela Torres
  • 4 de jan. de 2019
  • 2 min de leitura

Atualizado: 12 de fev. de 2019


Hoje vi um homem riscando o chão.


Eu cruzava o viaduto e, sentada nos bancos amortecidos de um ônibus velho, vislumbrava a vida externa à janela, já também envelhecida. A janela velha, a vida envelhecida do homem que riscava o chão.

Foi tão rápido, um lampejo de momento, mas meu cérebro sabe captar cenas assim. É involuntário - hobbie de escritor - vislumbrar um momento e pensar nele uma história.

Mas, o que aconteceu foi que parti, para onde a lata velha me levasse aquele momento. Cruzei o Arena, vi e ouvi as preparações para o Carnatal. A cidade estava em festa: de dia músicas, a noite luzes. Tudo agitava e isso é bom, pois anima o coração. Mas, enquanto a lata velha seguia seu trajeto de costume e deixava as pessoas espalhadas pela capital, deixava o Arena e seus preparativos para trás, o viaduto para trás, a vida envelhecida para trás... eu busquei serenidade naquele lampejo de momento.

É foto. Quando você guarda imagem assim é fotografia. Ainda que só eu tenha visto. E penso nesse momento quantas fotografias ocultas existem por aí, particulares e engavetadas dentro de neurotransmissores rebeldes e sensíveis. Quantas imagem verdadeiramente belas somos capazes de guardar? Tão pacíficas que, mesmo sendo jornalista, mesmo em mundo que vive de imagem, mesmo com fotógrafos aos montantes, seja tão singelo e pessoal que guardamos para nós. É um momento seu com a vida, íntimo demais para qualquer divulgação.

E segui refletindo sobre o íntimo, em como é constrangedor demais se despir para a vida. Mostrar-se realmente, suas qualidades e defeitos, seu lado selvagem e depois sereno. Vivemos na superfície, sentindo que ela nos protege dos enigmas abissais do mundo. Mas que loucura a nossa! Há festas em nosso íntimo, com espumantes e sorrisos verdadeiros. Mas esse contato é tão raro, uma conexão tão singular, que exige imergir em si. Como se mergulhar, sem se afogar.

Sigo nesse dezembro, pelas ruas de Natal, pensando que tentamos desesperados a todo momento gritar para o mundo quem somos, chamar atenção para nossa causa que é existir. E imagino que, não estaria o homem, descalço, aparentemente sofrido, com seu enorme giz, querendo o mesmo? Nunca soube o que ele escreveu em letras tão grandes, mas no fim, notei sua causa, sua existência, sua mensagem, e, ainda que ele não faça a mínima ideia de mim, ainda que seja um pintor e não quem eu pensei que fosse, naquele momento conversamos, ele com ele, eu comigo, e a vida com todas as infinidades abissais que existem em cada um sobre a face da Terra.

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